Assentimento ao Magistério (Parte III)

4. O ASSENTIMENTO DEVIDO AO MAGISTÉRIO

4.1 O Assentimento devido ao Magistério in genere et a priori

Como o Magistério Eclesiástico é uma participação no Magistério de Jesus Cristo, o assentimento devido a esse Magistério não pode ser exatamente o mesmo que é devido a um ensinamento puramente humano. No Magistério da Igreja, há o divino e o humano unidos em um verdadeiro mistério e trata-se de um verdadeiro poder dado por Deus à hierarquia da Igreja. A esse poder corresponde o direito de exigir de nossa inteligência que ela faça seus os termos e o sentido do ensinamento.[52] Trata-se de uma verdadeira autoridade doutrinal à qual corresponde a submissão do espírito. Todavia, é preciso ter claro que o assentimento exigido corresponde natural e necessariamente ao seu grau de autoridade. De outro modo, estaríamos diante de uma verdadeira incoerência e de uma verdadeira violência à ordem estabelecida por Deus.

Esse assentimento deve se manifestar, antes de tudo, na ordem externa. Isso significa que quando o Magistério da Igreja impõe com sua autoridade uma doutrina, já não é mais lícito para o fiel professar, defender, propagar a doutrina contrária. Esse assentimento exterior decorre da natureza social da potestas docendi, que reclama pelo menos aquilo que é reclamado por toda autoridade social, i.e., um assentimento exterior.[53]

No entanto, a própria natureza do poder doutrinal presente na Igreja exige uma verdadeira submissão da vontade[54] e da inteligência. Citamos Salaverri ipsis litteris:

« Cuando el Magisterio propone alguna doctrina sobre la fe o la moral, con su ciencia y veracidad propias y formalmente humanas, pero divinamente garantizadas por la asistencia de Cristo y del Espíritu Santo, proporciona al entendimiento un motivo seguro de asentimiento racional, y con verdadera autoridad, participada de la de Dios, reclama del hombre da debida sumisión intelectual, no igual, pero semejante a la del acto de fe, al que finalmente se ordena el Magisterio de la Iglesia; porque el motivo del asentimiento exigido no es precisamente el conocimiento intelectual de las razones intrínsecas de aquella doctrina, sino la misma ciencia y veracidad del Magisterio, garantizadas por la divina asistencia, como hemos procurado explicar.”[55]

Quando se fala, então, do assentimento da inteligência a um ensinamento do Magistério, o silentium oris (a não manifestação da opinião contrária), o silentium mentis (abster-se de julgar de outra forma) e o conformismus practicus (limitar-se a agir como se o ensinamento fosse verdadeiro) não são suficientes. É preciso um verdadeiro assensus voluntatis et intellectus (assentimento da vontade e da inteligência). É o primeiro passo do abneget semetipsum que nos pede Nosso Salvador. Eis, a priori, o assentimento que é devido em geral a todo ensinamento do Magistério da Igreja.

 

4.2 Repetitio est mater studiorum vel discendi

Antes de tratarmos do assentimento devido ao Magistério em espécie, convém fazer um lembrete no que tange ao assentimento humano. Como já dissemos, o assentimento depende inteiramente de seu motivo formal, quer dizer, das razões objetivas que conduzem a inteligência a julgar com maior ou menor certeza. É preciso lembrar também que o assentimento absoluto da inteligência só pode ser o da certeza metafísica – excluindo toda possibilidade de erro em virtude da evidência metafísica do objeto (tal coisa é o que ela é e não é o que ela não é, e.g.) – ou pela autoridade infalível do testemunho de outrem. Somente essas duas coisas podem levar a inteligência à adesão absoluta, total, sem reserva nem condição: a evidência metafísica ou a autoridade infalível de uma testemunha. Na ausência desses motivos formais, a inteligência não pode excluir a possibilidade de que o oposto seja verdadeiro e não pode, consequentemente, assentir de maneira absoluta. Estaremos, nesse caso, diante da opinião ou da certeza física ou moral.

A natureza e o grau do assentimento à testemunha dependem de sua autoridade. Ora, o Magistério é – em relação à Revelação e às matérias a ela intimamente conexas – como uma testemunha que guarda, explica, explicita, declara e defende o depósito que lhe foi confiado. Resta claro, assim, que a cada grau do Magistério, isto é, a cada grau de autoridade do Magistério corresponderá um assentimento diferente porque os motivos formais de assentimento – os graus de autoridade da testemunha – terão graus diversos. Dessa forma, a inteligência assentirá com maior ou menor certeza na medida em que a autoridade engajada for mais ou menos importante.

Salaverri resume assim essa doutrina: “Los grados de asentimiento debido al Magisterio corresponden exactamente a los grados de autoridad con que el Magisterio lo exige. Las limitaciones que a cada grado se pueden asignar son proporcionales a lo que de humano interviene, al lado de lo divino, e nel misterio de la potestad magisterial”[56].

É necessário, agora, determinar em que consiste o assensus internus voluntatis ET intellectus em cada grau particular do Magistério. Esse assentimento, bem como o próprio Magistério com o qual ele corresponde perfeitamente, só pode ser analógico. Passemos ao ponto seguinte.

 

4.3 O Assentimento devido ao Magistério in specie

4.3.1 O Assentimento devido ao Magistério infalível

No Magistério infalível, como já foi dito, a autoridade engajada é a maior possível e a participação no munus docendi de Nosso Senhor é a mais profunda possível. Essa autoridade é mais divina do que humana e seu ensinamento é garantido contra toda possibilidade – non tantum de facto, sed etiam de iure – de erro, em virtude da assistência divina. O Magistério é, aqui, uma testemunha infalível do depósito da Revelação e de tudo aquilo que está intimamente ligado a ele.

A esse grau supremo do Magistério corresponde o grau supremo de assentimento. O assentimento que todo fiel deve ao Magistério infalível é um assentimento absoluto porque o ensinamento infalível exclui toda possibilidade de erro, visto que ele está garantido eficazmente na verdade pelo próprio Deus.  Aqui não há lugar para a suspensão de assentimento, qualquer tipo de ressalva, condicionamento ou hesitação. A submissão da inteligência deve ser total, sem possibilidade de apelação.[57] O assentimento firme e irrevogável é uma obrigação grave para todos face à testemunha infalível que é esse Magistério.

4.3.2 O Assentimento devido ao Magistério Supremo não-infalível

É nesse nível que se encontra a questão fundamental em relação ao assentimento devido ao Magistério, sobretudo nesses tempos difíceis de crise pós-Concílio Vaticano II.

Qual deve ser a atitude do fiel diante da autoridade suprema da Igreja quando essa ensina de maneira somente autêntica, sem engajar a sua infalibilidade? Encontram-se, hoje, sobretudo, duas posições majoritárias e francamente opostas: i) a posição dos assim chamados conservadores e sedevacantistas, que afirmam a submissão absoluta aos atos desse Magistério e ii) a posição dos neomodernistas e progressistas em geral, que afirmam que nenhum assentimento é devido aos ensinamentos desse tipo de Magistério.[58] Encontramo-nos, assim, diante de um dilema: aceitar tudo ou rejeitar tudo.

Nesse grau de Magistério, como já dito, o lado humano é suficientemente grande para que o ensinamento não seja infalível. Assim, a assistência divina, apesar de existir, não é absoluta e a possibilidade de erro é, portanto, real. E como nos diz São Tomás: quod possibile est non esse, quandoque non est (o que é possível não ser, às vezes não é).[59] O erro pode existir não somente de direito, mas também de fato no ensinamento não-infalível da autoridade suprema.[60] Na ausência da definitio, o erro pode se fazer presente. O Magistério, nesse caso, não se constitui – e isso voluntariamente pela ausência da voluntas definiendi/obligandi – uma testemunha infalível.

Ora, já demonstramos que a “inteligência é uma potência necessária e é impossível que se incline ao assentimento absoluto, salvo pela evidência metafísica do objeto conhecido ou pela autoridade infalível da testemunha”.[61]

O assentimento ao Magistério Supremo não-infalível não pode, então, ser absoluto e a maioria dos teólogos diz que se trata de um assentimento moralmente certo. Trata-se, por conseguinte, de uma certeza moral, que, como dissemos, não exclui a possibilidade do erro, mas somente a sua probabilidade. Os teólogos acrescentam que esse assentimento deve ser também condicionado, quer dizer, implicando a seguinte condição: a não ser que o contrário seja decidido ou tenha sido decidido pela Igreja e a não ser que o contrário seja demonstrado com verdadeira evidência pela razão. Trata-se, pois, de um assentimento interno e religioso[62] da vontade e da inteligência, mas que é moralmente certo e condicionado. Querer fazer desse assentimento uma adesão absoluta é contrariar a própria lei natural. É impossível para o homem aderir a algo de maneira total e absoluta, na ausência da evidência metafísica ou de uma testemunha infalível. Por outro lado, negar a priori o dever de assentimento ao Magistério mere authenticum é desconhecer os diferentes graus de assentimento de que a inteligência é capaz, caindo na univocidade mais completa. É preciso assentir ao Magistério puramente autêntico, mas com o grau que lhe é devido.

Deve-se, então, ao Magistério supremo não-infalível um verdadeiro assentimento interior da inteligência e da vontade[63], salvo se a condição se realiza. Dito de outro modo, no caso de evidência do contrário, seja por demonstração da razão (o que não deve ser admitido facilmente, mas somente por alguém capaz na matéria correspondente e depois de longa reflexão diante de Deus), seja por definição da Igreja, é lícito suspender o juízo, duvidar e mesmo dissentir[64], embora sempre com a reserva e a prudência que nos impõem o respeito devido à Autoridade Suprema da Igreja e as circunstâncias. O nível de publicidade da reação será determinado, sobretudo, pelo grau de danos eventualmente causados por tal erro. Um recurso ao Magistério infalível também é possível, como sugere Monsenhor Brunero Gherardini em sua súplica[65] ao Santo Padre.

Pode-se ver claramente a doutrina do assentimento concernente ao Magistério Supremo não-infalível. É preciso assentir realmente, com um assentimento interno da inteligência e da vontade por um motivo religioso. Esse assentimento, entretanto, não pode ser absoluto porque falta a evidência da coisa ela mesma e falta a autoridade evidente de uma testemunha infalível.

Trata-se, então, de um assentimento correspondente à certeza moral e condicionado, porque em certas condições – a definição do contrário pela Igreja ou a evidência do contrário provada pela razão – esse assentimento não será mais obrigatório. Os teólogos atuais esquecem com muita frequência a condicionalidade desse assentimento. Eles esquecem os si (se), quamdiu (enquanto), nisi (salvo se), donec (até que), utilizados pelos teólogos católicos para indicar a condicionalidade desse assentimento e expõem o Magistério Supremo mere authenticum como se obrigasse a uma adesão absoluta.[66] É um assentimento condicionado e as condições que podem levar ao não assentimento não são puramente teóricas e podem existir hic et nunc, concretamente aqui e agora, mesmo se na história os casos são assaz raros.[67] Farta citação de teólogos é trazida no Apêndice 1.

Querer fazer desse assentimento moralmente certo e condicionado um assentimento absoluto ou um simples não assentimento é desconhecer a natureza humana e a doutrina da Igreja claramente exposta pela maioria esmagadora dos teólogos. Querer mudar essa posição – ainda que seja somente na prática, como se se devesse um assentimento absoluto a esse grau de Magistério – é ir contra a lei natural e contra a mens Ecclesiae. Assentimento, sim. Mas não absoluto. Assentimento moralmente certo e condicionado.

 

4.3.3 O Assentimento devido ao Magistério dos Bispos em relação aos fiéis que lhe são confiados

O Magistério dos Bispos diocesanos é um Magistério particular e subordinado ao do Papa. É um Magistério autêntico que se exerce sob a assistência divina e por isso é preciso se submeter a ele e aderir a ele. O fiel católico, dócil à sua condição de subordinado, deve ter uma atitude habitual de assentimento ao ensinamento de seu Bispo.

Não obstante, o ensinamento do Bispo é uma participação menor no Magistério de Nosso Senhor e, por essa razão, não goza de uma assistência absoluta. Trata-se de um Magistério falível, que pode conter erros e os contém por vezes. A história prova isso suficientemente. Diante da ausência de uma testemunha infalível, a inteligência não pode dar um assentimento absoluto. A possibilidade de erros o impede. Devem-se aplicar os mesmos princípios estabelecidos para o Magistério supremo não-infalível, mutatis mutandis. As condições para recusar o assentimento são, evidentemente, menos estritas.

Assim, deve-se sempre estar disposto a aceitar interiormente (pela inteligência e vontade) a doutrina ensinada por um Bispo diocesano. No caso, porém, em que se encontram razões sérias contra o ensinamento episcopal, será lícito suspender o juízo, duvidar e mesmo dissentir, mas sempre de forma respeitosa e reservada, segundo os termos acima, e com a faculdade de apelar à autoridade superior, se a questão assim o exigir.

 

4.4 Graus de Magistério implicam graus de assentimento

Parece solidamente estabelecido que a cada grau do Magistério corresponde um grau de assentimento. E isso por causa da natureza profunda do Magistério eclesiástico enquanto participação mais ou menos perfeita na potestas docendi de Nosso Senhor, encontrando-se nos diversos graus de Magistério uma assistência divina mais ou menos eficaz. E também por causa da natureza da inteligência que pode assentir de maneira absoluta somente se encontra a evidência da coisa em si mesma ou a evidência da infalibilidade da autoridade que afirma uma doutrina ou uma verdade. Grau de assentimento corresponde necessariamente a grau de Magistério. Não se pode negar isso sem cometer erro tanto em relação ao Magistério Eclesiástico quanto à teoria do conhecimento do homem. Negar isso é ir contra a Revelação e a lei natural.

 

5. CONCLUSÃO – TERTIUM DATUR: DOCTRINA CATHOLICA               

Foi exposta, suficientemente para que fosse compreendida, a doutrina da Igreja concernente ao seu próprio Magistério tal qual nos foi transmitida pela Tradição. Essa doutrina católica parece ser a única possível segundo a Revelação e segundo a lei natural. Opor-se a essa doutrina é um erro grave com consequências importantes não somente de ordem especulativa, mas também de ordem prática, como se constata atualmente: de um lado a recusa de toda autoridade que não é infalível, como se a autoridade infalível fosse a única verdadeira autoridade; de outro lado, querer fazer de toda autoridade uma autoridade infalível, também como se não existisse outra autoridade além da infalível.

O Magistério Eclesiástico é uma noção analógica, comportando vários graus que vão do Magistério infalível ao Magistério dos Bispos diocesanos, passando, entre outros, pelo Magistério Supremo puramente autêntico. A cada grau do Magistério, que se funda sobre a autoridade com que tal ensinamento particular é feito, corresponde necessariamente um grau de assentimento distinto.

O Magistério puramente autêntico tem uma verdadeira autoridade que decorre da potestas docendi de Nosso Senhor Jesus Cristo, mas o grau de participação nesse poder não faz desse Magistério um Magistério ao qual é devido um assentimento absoluto e irrevogável. Não se deve confundir aquilo que a Igreja distingue: Magistério infalível e Magistério não-infalível de um lado e assentimento absoluto e assentimento moralmente certo e condicionado do outro. Não se trata de desprezar aquilo que a Igreja ensina por seu Magistério não infalível, que permanece o modo regular e normal de ensinar, mesmo se in paucioribus (em certos casos raros) esse grau de Magistério pode conter erros.

Entre os dois extremos[68], um por defeito (o Magistério não infalível não tem nenhum valor: modernistas, progressistas e liberais) e o outro por excesso (todo Magistério que vem do ápice da hierarquia é necessariamente infalível: conservadores, sedevacantistas e certos tradicionalistas), tertium datur: doctrina catholica. Ao Magistério supremo não-infalível é devido um assentimento religioso e interno da inteligência e da vontade. Ele é, porém, somente moralmente certo e condicionado. Se o contrário do ensinamento desse Magistério foi ou for decidido pela Igreja, ou demonstrado com verdadeira evidência pela razão – o que não deve ser facilmente admitido[69] – o fiel católico pode licitamente suspender o juízo, duvidar e mesmo dissentir, sempre com a reserva que nos impõem a prudência e o respeito devido à autoridade, sobretudo à autoridade suprema. As condições e limites dessa reserva serão determinados pelas circunstâncias e, máxime, pelo grau de dano que pode causar tal erro.

Eis, então, uma breve exposição da doutrina católica, e que nos permite permanecer fieis ao próprio Magistério e à lei natural, conciliando a natureza e a sobrenatureza porque essa aperfeiçoa aquela sem destruí-la.

Pe. Daniel Pinheiro


[52] Pio IX, Tuas Libenter; Leão XIII, Immortale Dei; São Pio X, Singulari quandam; Pio XII, Humani Generis.

[53] Salaverri, Joaquín. La Potestad de Magisterio Eclesiástico y asentimento que le es debido in Estudios Eclesiásticos n. 29, 1955, p. 188.

[54] Submissão também da vontade porque se o objeto do ensinamento do Magistério não é evidente per se, é preciso que a vontade mova a inteligência para que essa possa aderir ao objeto, em virtude do testemunho.

[55] Salaverri, Joaquín. La Potestad de Magisterio Eclesiástico y asentimento que le es debido in Estudios Eclesiásticos n. 29, 1955, p. 189. “Quando o Magistério propõe alguma doutrina sobre a fé ou a moral, com sua ciência e veracidade próprias e formalmente humanas, mas devidamente garantidas pela assistência de Cristo e do Espírito Santo, proporciona ao entendimento um motivo seguro de assentimento racional, e com verdadeira autoridade, participada da de Deus, reclama do homem a devida submissão intelectual, que não é igual, mas semelhante à submissão do ato de fé, ao qual se ordena, em fim de contas, o Magistério da Igreja. Isso porque o motivo do assentimento exigido não é precisamente o conhecimento intelectual das razões intrínsecas daquela doutrina, mas a própria ciência e veracidade do Magistério, garantidas pela divina assistência, como procuramos explicar.”

[56] Salaverri, Joaquín. La Potestad de Magisterio Eclesiástico y asentimento que le es debido in Estudios Eclesiásticos n. 29, 1955, p. 190. “Os graus de assentimento devidos ao Magistério correspondem exatamente aos graus de autoridade com que o Magistério o exige. A limitações que podem ser assinaladas a cada grau são proporcionais ao que de humano intervém, ao lado do divino, no ministério do poder sacerdotal.”

[57] Salaverri, Joaquín. La Potestad de Magisterio Eclesiástico y asentimento que le es debido in Estudios Eclesiásticos n. 29, 1955, p. 190

[58] Essas duas posições opostas encontram, porém, suas respectivas raízes no mesmo erro: a univocidade do Magistério. A primeira posição com o fim de considerar todo Magistério da autoridade suprema como infalível: conservadores e sedevacantistas. A segunda para negar autoridade a todo ato do Magistério não infalível, como se esse não se tratasse de um verdadeiro Magistério: modernistas e progressistas em geral. No fundo essas duas posições dizem: se é verdadeiramente Magistério da autoridade suprema, tal Magistério tem que ser infalível e o assentimento deve ser absoluto. Esse princípio errôneo da univocidade do Magistério é o princípio real que explica a atitude desses grupos face ao Magistério supremo não-infalível. A reação unívoca deles supõe um princípio univocista: agere sequitur esse.

[59] Summa Theologiae, I, q.2, a.3.

[60] Ver nota 48.

[61] Salaverri, Joaquín. La Potestad de Magisterio Eclesiástico y asentimento que le es debido in Estudios Eclesiásticos n. 29, 1955, p. 191: “(…) el entendimiento es potencia necessária, y no siendo posible que se mueva al asentimiento absoluto, sino o por la evidencia metafísica del objeto conocido o por la autoridad infalible del testimonio(…)”.

[62] Esse assentimento é dito religioso porque é dado por causa de um motivo religioso, isto é, por causa da reverência devida a Deus, que governa os fiéis pela autoridade hierárquica e sagrada da Igreja. Ver J. Salaverri. De Ecclesia Christi.Bac, 1955, Madrid, p. 716 n. 666.

[63] PARENTE, Petrus. Collectio Theologica Romana, Vol. I. Marietti, 1954, 4ª Editio, pp. 233 et 234. Ver também: PENIDO, Teixeira-Leite. O Mistério da Igreja. Vozes, 1952, pp. 328-331.

[64] São as palavras do próprio Salaverri, Joaquín. La Potestad de Magisterio Eclesiástico y asentimento que le es debido in Estudios Eclesiásticos n. 29, 1955, p. 191 : “Pero si La demonstración de lo contrario se comprobare ser inequívocamente cierta, entonces nos será lícito suspender el juicio, dudar y aun también disentir, aunque siempre con la reserva y cautelas que nos impone el respeto debido al Jerarca supremo.” “Mas se a demonstração do contrário for comprovada inequivocamente certa, então nos será lícito suspender o juízo, duvidar e mesmo dissentir – embora sempre com a reserva e cautelas que nos impõe o respeito devido à autoridade suprema.”

[65] Mons. Brunero Gherardini, Concílio Vaticano II – Um debate a ser feito.Editora Pinus, Brasília, 2011.

[66] Dou minha adesão, se a Igreja não decidiu o contrário. Dou minha adesão enquanto minha razão não demonstrou com certeza absoluta o contrário. Dou minha adesão, salvo no caso de decisão precedente contrária da Igreja. Dou minha adesão até que a Igreja decida de outra forma, se assim ocorrer. Eis alguns exemplos de como essas partículas exprimem a condicionalidade do assentimento.  Ver Apêndice 1.

[67] Essa raridade não impede que em dada época se apresentem casos mais numerosos que em outros momentos da história.

[68] Já afirmamos e reafirmamos que a raiz desses dois erros é o mesmo princípio: o Magistério (ao menos o do Papa) só pode ser infalível. É o erro da univocidade do Magistério.

[69] Salaverri, Joaquín. La Potestad de Magisterio Eclesiástico y asentimento que le es debido in Estudios Eclesiásticos n. 29, 1955, p. 191: “E nel caso en que ocurriere la evidente demostración de lo contrário, ante todo se ha de pensar en que las demostraciones humanas son falibles, y por el lo hemos de ser muy cautos para no admitir las, sino después de muy madura ponderación. Pero si La demostración de lo contrario se comprobare inequívocamente cierta, entonces será lícito suspender el juicio, dudar y aun también disentir, aunque siempre com la reserva y cautelas que nos impone El respeto debido al Jerarca Supremo.” “No caso em que ocorresse a evidente demonstração do contrário, deve-se pensar, antes de tudo, que as demonstrações humanas são falíveis e que, por isso, devemos ser muito cautelosos, a fim de admiti-las somente depois de madura ponderação. Mas se a demonstração do contrário for comprovada inequivocamente certa, então, nos será lícito suspender o juízo, duvidar e mesmo dissentir, embora sempre com a reserva e cautelas que nos impõe o respeito devido à autoridade suprema.”

NOTA

Os artigos publicados nessas páginas não têm fim polêmico, mas têm por escopo propiciar aos leitores um olhar objetivo e profundo sobre os assuntos tratados, a partir do exercício da legítima liberdade teológica acordada a certas matérias. É evidente que não há aqui qualquer pretensão de se substituir ao Magistério da Igreja, a quem cabe a palavra final em matéria de fé e moral, bem como nas matérias intimamente conexas com a fé e a moral. 

É evidente, outrossim, que os trabalhos aqui expostos exprimem tão somente a opinião particular de seus autores e não engajam as instituições de que possam fazer parte.

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